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OS DESAFIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA NA ATRACÇÃO DO INVESTIMENTO DIRECTO ESTRANGEIRO

Fausta Lourenço | Advogada

Antes de partir para as questões de fundo, importa percebermos o sentido lato das palavras-chave que nos conduzirão a uma melhor compreensão do assunto em pauta, nomeadamente, segurança jurídica, investimento e investimento directo estrangeiro. A segurança jurídica ganha uma acepção diferente dependendo do contexto em que estiver inserida, sendo que, para qualquer caso, deverá passar uma ideia de estabilidade ou de confiança. Para o que tratamos, entendemos a segurança jurídica como um princípio de previsibilidade e coerência que norteia a aplicação das normas jurídicas sobre o ambiente de negócios de determinado país, garantindo aos investidores um cenário mais estável nas relações de negócios que estabelecem entre si e dentre estes e o Estado. É a garantia que orienta o investimento, baseada na expectativa de que a situação jurídica existente no despoletar do investimento deverá ser a mesma ao fim do mesmo, possibilitando que o investidor possa usufruir dos benefícios que inicialmente identificou como possíveis.

O investimento em linhas gerais se traduz na aplicação de capital ou outro recurso com a expectativa de um benefício futuro, de um retorno financeiramente positivo. Resta-nos perceber a que se refere o investimento directo estrangeiro. Resulta da lei n.º 10/21 de 22 de Abril – Lei do Investimento Privado (LIP), que o investimento directo “é todo o investimento privado externo ou interno, que consista utilização no território nacional de capital, tecnologia e conhecimento, bens de equipamento e outros em projectos económicos ou na utilização de fundos destinados à criação de novas empresas, agrupamentos de empresas, nacionais ou estrangeiras, bem como à aquisição total ou parcial de empresas de direito angolano já existentes, com vista à criação ou continuação de determinada actividade económica e participação directa na sua gestão, de acordo com o respectivo objecto social.”

Note-se que a referência ao investimento directo não se resume ao investimento estrangeiro, abarcando também situações de investimento nacional.

A capacidade de produzir bens e serviços está relacionada com o nível de produtividade do país, e a pobre estrutura industrial,

resulta na necessidade de termos força estrangeira a alavancar grande parte da economia. Força estrangeira a trabalhar em Angola pressupõe a necessidade de organização desta força em um veículo jurídico capaz de dar sustentabilidade, frise-se jurídica, à execução de determinado projecto.

Assim, antes da introdução em mercado nacional, investidores estrangeiros procuram elementos que lhes garantam que o investimento realizado gerará frutos, sem prejuízo dos riscos inerentes a qualquer investimento.

Alguns destes elementos são objecto de um relatório anual publicado pelo Banco Mundial – o Doing Business – o que na tradução literal seria “Fazer Negócio”.

Este relatório analisa indicadores de vária natureza, fazendo uma análise da evolução do país ao longo dos anos, assim como daquele comparativamente aos demais países objecto de avaliação. A classificação é feita em duas vertentes, sendo uma a que atribui uma pontuação tendo em consideração determinado indicador que vai de 0 a 100, sendo o 100 uma correspondência do “Cumpre com o objectivo”, e outra espelha a posição de Angola na avaliação global, que atende pelo número de países avaliados. Em 2021, foram avaliados 190 países, estando Angola em qualquer uma das classificações, abaixo das expectativas, sem prejuízo das visíveis melhorias em determinados sectores.

Os principais indicadores têm que ver desde logo com (i) a constituição da empresa, (ii) obtenção de licenças para o exercício de actividade (sendo a mais crítica a licença de construção), (iii) obtenção de electricidade, (iv) registo de propriedade industrial e intelectual, (v) obtenção de financiamento bancário, (vi) protecção jurídica de investidores minoritários, (vii) pagamento de impostos e outros encargos fiscais, (viii) comércio entre empresas de países diferentes, (ix) cumprimento de contratos e (x) resolução de insolvência. Em termos de posição, Angola apresenta-se em um mínimo de 106 e máximo de 186 e em termos de pontuação Angola apresenta-se entre o 0 e máximo de 79,4.

As áreas que maior progressão se registaram e que melhor classificadas foram, são as de constituição de empresas e pagamento de impostos e outros encargos fiscais. Quanto às demais ainda existe um trabalho muito grande por se fazer.

Até Março de 2022, o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 2018-2021 teve um grau de execução na ordem dos 65,75%, de acordo com um comunicado da 3.ª Reunião Ordinária da Comissão Económica do Conselho de Ministros. O referido Plano já previu um conjunto de medidas para melhorar a posição de Angola no Doing Business, sendo que algumas já estão em execução, outras executadas, como sejam a revisão da LIP, a redefinição de políticas tributárias, tentativa de simplificação e redução dos custos para exportação, funcionamento das salas especializadas em matéria comercial e de propriedade industrial e intelectual, garantindo um melhor cumprimento dos contratos. Segundo o Relatório de Projectos de Investimento publicado pela AIPEX - Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações de Angola, em Agosto de 2022, tem-se verificado uma baixa em investimento privado, ilustrando o quadro abaixo com maior detalhe: A queda em termos de investimento resulta de um período de recessão económica de mais de quatro anos consecutivos (e que ainda se continuam a dar passos para uma saída efectiva), de que Angola se encontrava submergida desde 2016, tendo verificado um aumento de 0,7% contra os 0,2% previstos pelo Executivo, segundo dados publicados pelo Instituto Nacional de Estatística.

Estes resultados são atribuídos essencialmente às actividades de agro-pecuária e silvicultura, diamantes, indústria transformadora, comércio geral e outros, que constituem algumas das áreas prioritárias em termos de investimento privado, com benefícios específicos atribuídos pela LIP e que inclusive algumas gozam de um quadro legal específico de concessão de crédito (crédito ao sector real da economia), o que em termos gerais poderá potencializar o interesse de investidores estrangeiros.

Ainda há muito por se fazer, mas se cada interveniente do mercado assumir a sua responsabilidade e perceber o grau de importância que desempenha para alavancar a economia do País, desde o Estado por intermédio das suas instituições, investidores (nacionais e estrangeiros) ao consumidor final, efectivamente bons resultados serão conseguidos.

Para o ciclo de governação 2022-2027, em termos económicos, tem de ser, sem dúvida, a retomada do crescimento económico. De facto, depois de uma longa “estiagem” em resultado de recessões seguidas, por razões sobejamente conhecidas

OPINIÃO

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2022-10-10T07:00:00.0000000Z

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