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“A NOSSA MADEIRA AINDA NÃO ESTÁ CLASSIFICADA A NÍVEL INTERNACIONAL”

Texto: Patrícia de Oliveira

ENTREVISTA

O atraso na entrega de licenças, a burocracia, a falta de vias de acesso reduziu a produção de madeira na ordem de 40%, na campanha 2020/2021. A Afirmação é do Presidente da Associação dos Madeireiros e Industriais, Miguel Lissala Tchiovo, para quem a falta de classificação da madeira nacional torna os preços baixos

Como caracteriza a produção de madeira na província do Cuando Cubango? Neste momento, a produção está suspensa. Estamos à espera do certificado de produto estância, que permite o madeireiro fazer a evacuação do produto cortado durante a campanha anterior. No ano passado, os produtores só receberam as licenças no mês de Setembro, no fim da campanha. Por esse motivo, pedimos uma prorrogação, felizmente o Ministro da Agricultura aceitou e tivemos mais dois meses para trabalharmos. São essas situações que travam o investimento na área florestal.

Qual é a quota de produção da província? A quota de produção do Cuando Cubango é de 15 mil metros cúbicos, mas nunca atingimos essa meta em função dos atrasos na entrega dos documentos. Se chegarmos a oito mil metros cúbicos é com muita sorte. Penso que houve uma produção na ordem dos 60%. A produção ainda não está transformada para ser vendida. A lei 6/17 exige que a produção de madeira tenha de ser vendida em bloco, semitransformada, em prancha e a transformação é um processo que leva mais tempo que o corte. Com essa paralisação a maior parte da produção de madeira encontra-se nos estaleiros.

Como pensam contornar a situação? Estamos à espera que sejam emitidos certificados de estância para transportar a madeira para os grandes mercados de venda.

Quanto tempo leva para a emissão do certificado?

Em princípio leva cinco dias, mas estamos desde 31 de Janeiro que fizemos o pedido para a aquisição dos documentos e até gora nada. Estive no Ministério da Agricultura em busca de informações e informaram-nos que estão já a passar os certificados.

Para quanto caiu a produção de madeira? A produção de madeira reduziu a 40%. Temos falta de máquinas para o corte, falta de vias de acesso que encarece a transportação para outros mercados. Por outro lado, a madeira não tem classificação internacional, o que reduz o preço da venda.

Anteriormente, o Cuando Cuango se destacava na produção de madeira, o que aconteceu?

Em 2017, o Cuando Cubango teve um grande volume de produção de madeira, posteriormente houve uma invasão dos empresários. As pessoas compravam grandes quantidades e exportavam para conseguir obter dólares. Para travar a situação, o governo publicou a lei 6/17 que proíbe o corte da madeira massiva e impôs que para ser transportada deve ser semitransformada, que anteriormente era vendida em touro. De 2019 até 2020, a produção reduziu consideravelmente. A exploração de mussivi, que é a espécie mais procurada, não é permitida e as outras espécies não há tanta procura.

Quais as espécies de madeira exploradas no Cuando Cubango?

Temos mussivi, que é a melhor do país e está no topo, mucussi, muvala e girassonde. O preço varia consoante a qualidade do produto. A madeira é vendida por toneladas.

Quanto custa uma tonelada?

Tem muito a ver com a procura e a oferta. A tonelada pode custar 200 mil kwanzas, por exemplo, um camião trailer transporta 30 a 40 toneladas.

Quais são os municípios que mais produzem madeira?

Os principais municípios que se destacam na produção da madeira são o Cuito Cuanavale, o Menongue, Cuchi e Chuangari. Actualmente, o Cuito lidera a produção de madeira com 40 % de produção porque

“O maior problema das árvores em Angola não é a actividade florestal, mas a população local que faz queimadas para a sobrevivência”

tem mais de 200 quilómetros de estrada asfaltada e faz com que haja maior concentração da actividade florestal. No entanto, os outros também possuem, porém há dificuldades de acesso para retirar o produto. Carece de pontes e estradas. No Cuando Cubango temos três municípios em que não são permitidos exercer a actividade florestal, mas possui madeira de qualidade, que é o Dirico, Rivungo e uma parte de Mavinga, porque fazem parte do projecto transfronteiriço turístico internacional Okavango/zambeze, para a conservação ambiental, que envolve cinco países.

Quanto é que se gasta com a transportação da madeira de Luanda para o Cuando Cubango e vice-versa?

A transportação da madeira é um grande problema por falta de vias. De Luanda ao Cuando Cubango o custo de transporte é de um milhão e 500 mil kwanzas, ao passo que se fosse por via ferroviária o operador pagaria 300 mil kwanzas. Já no interior do município custa 100 mil kwanzas.

E porque é que não se usa o Caminho-de-ferro de Moçâmedes para transportar a madeira?

O Caminho-de-ferro não tem vagões para o transporte de mercadorias. Estamos a falar numa quantidade de 450 contentores de 30 a 40 pés. Temos de tirar a madeira do Cuando Cubango para o Lobito por meio de camiões.

Qual é o destino da madeira?

A madeira do Cuando Cubango vai para Luanda, posteriormente é exportada para paises asiáticos para a produção de diversos artigos.

Que medidas devem ser tomadas para aumentar a produção de madeira, particularmente na vossa província? Precisamos de financiamento bancário porque a madeira é um recurso de extrema importância no país, deve ser explorada e cria empregos. Queremos parcerias para aumentar o número de infraestruturas, sobretudo estradas e pontes. Especial atenção por parte do Executivo para conseguir vender madeira através da realiza

ção de feiras. Temos de explorar a nossa madeira, que ainda não está classificada a nível internacional, daí a necessidade de um trabalho apurado sobre os diferentes tipos de madeira e definição das suas características. Por falta de classificação, no acto de venda há prejuízos. Muitas vezes somos obrigados a vender a preços baixos.

E quanto à situação dos equipamentos para exploração?

Até agora, o Cuando Cubango não beneficiou de nenhum tipo de equipamentos de corte ou transformação. Gostaríamos que se fizesse o mesmo que acontece com as cooperativas agrícolas. Antigamente ,o Ministério da Agricultura fornecia kit de exploração florestal aos madeireiros, que permitia o aumento de produção. O aluguel das máquinas custa um preço elevado e a actividade ao invés de ser produtiva, tem sido de sobrevivência porque os detentores dos equipamentos são os estrangeiros. Muitas vezes, para explorar temos de dividir o produto com o dono das máquinas e a actividade deixa de ser lucrativa.

Qual seria a solução?

Os bancos podem importar equipamentos e gerir os mesmos ou fazer o aluguel.

Os madeireiros têm cumprido com o período da pausa florestal, considerando que a actividade vai de Maio a Outubro? Sim. O maior problema das árvores em Angola não é a actividade florestal é a população local, que faz queimadas para sobrevivência, bem como a caça, e a produção de carvão. Este processo é violento para as árvores. Temos falado com a comunidade para evitar queimadas e muitas vezes oferecemos empregos.

Que projectos estão em carteira?

Temos um projecto que consiste no repovoamento florestal a nível da província do Cuando Cubango, num espaço de 10 mil hectares para a produção de eucaliptos e pinhos. Já existe um viveiro, mas precisa-se de investimento de quatro milhões de dólares. A procura de madeira no mundo é cada vez maior, por esse motivo é preciso investir em estratégias de produção. Este projecto poderá proporcionar muitos empregos e uma fonte de madeira e carvão. Neste momento, os que estão a agredir a floresta são os camponeses, caçadores e carvoeiros.

Quantos associados vocês controlam? No total, a associação conta com 54 membros, deste número apenas 36 possuem licenças de exploração.

A quota de produção do Cuando Cubango é de 15 mil metros cúbicos, mas nunca atingimos essa meta

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